29 agosto 2008

Asas....


Aprendi a desembaraçar-me sozinha no princípio dos tempos, antes da fogueira aquecer os povos nas gélidas montanhas do Norte.

À medida que o mundo mudava e as terras eram desbravadas, as asas que me protegeram, tornaram-se na minha vergonha e no meu pesadelo, à medida que o mal se apoderava da mente dos Homens. Escondi-me durante milénios. Infiltrei-me nos covis dos ladrões, fui para orfanatos com cheiro a mofo, para me juntar aos que pensava que eram como eu - rejeitados. Sempre só, sempre perdida. A civilização reconhecia-me como uma vagabunda, suja e selvagem...
Nesse dia, apareceste no meu mundo e entreguei-me à rebeldia que exalava do teu ser pulsante de novas e arriscadas aventuras.
Eras como eu...
As tuas asas, amaldiçoadas por todos os que nos renegavam, envolveram as minhas e o desejo de voar inundou-nos o espírito ansioso por descobrir. Atravessámos os céus nocturnos e o mundo era só nosso. Foi um vislumbre da felicidade!

De repente, tudo terminou...

Fomos descobertos e perseguidos pelos demónios que roubaram as asas a tantos outros como nós.

No mundo paralelo que criámos, só conseguimos sobreviver à espera da morte em cada esquina sombria, em cada beco escuro e as asas de nada nos valiam.

Decidi partir para longe... Deixar de sentir o peso dos segredos da minha existência.

Olhas-me com aquele olhar perdido e sem rumo, como se a terra tivesse fugido de debaixo dos teus pés para te deixar cair no infinito. Não quis despedir-me de ti... Vou só, até descobrires em ti a força que te fará partir também. A tua sombra não me seguiu e assim seguimos o destino, sempre a um passo à frente do nosso.