27 setembro 2006

Os meus elementos


Nas estrelas, no oceano, na montanha, em todo o sonho que nos envolve, há alguém que nos chama num sussuro que só é perceptível aos ouvidos dos que parecem felizes e escondem por trás dos seus rostos vazios a neblina que os cega.
Através dos tempos, a contar de algures na memória dos antepassados longíquos, há mensagens que fluem por todos os elementos. Pela água correm os seres invisíveis que tornam refrescante o sorriso que, como uma corrente, é iluminado pelo fogo que nasce do bem e do mal. Com o fogo flui o ar galopante beijando docemente a essência da vida que brota da terra para que tudo se reflicta em nós...
Nós somos a passagem de todos os sentimentos que não podem ser transpirados pelos elementos e tudo o que fazemos, todas as nossas necessidades são passadas pelo fio condutor de que somos feitos.
A noção de perda, de vertigem e de medo são a atracção exercida por elas quando existe saturação, quando naquele momento já não há espaço para a libertação. No entanto, a alegria, o amor e a tranquilidade são a deslocação dos elementos entre si, comunicando com todo o envolvente.
Não existe o fim, apenas o trilho para descobrir novas formas de chegar a outro lugar.

05 setembro 2006

É do silêncio que tenho medo.


Hoje de manhã fechei os olhos com força, soprei a areia que tinha na mão e pensei na poeira e no fumo do durante.
O papão dos pesadelos de infância transformaram-se nos carrascos das nossas mães e dos nossos irmãos.
Depois dos dias de sol, todos fomos transformados em bestas.
Eramos os animais, feridos e mortos sem rosto. Fomos desfigurados pelo terror e pela esperança conquistada ao sabor amargo do desejo de vingança. E dava-lhes mais prazer do que quando estavam com as putas do sítio a que chamam o bairro deles...
Sobrevivemos à dor.Sobrevivemos à humilhação.
Escapámos aos ataques constantes dos de fora.
Agora, passaram-se anos e anos e a memória continua em carne viva. A ferida abre-se constantemente no silêncio que vem quebrar a ilusão de que tudo está bem.
É do silêncio que tenho medo.
Traz-me o cheiro de carne a queimar, a carne dos meus.
Os meus que nunca conseguiram transpor o muro.
O muro que lhes gritava liberdade.
A liberdade que conquistei à custa dos seus gritos, dos seus olhares perdidos, do medo e da angústia, da súplica das suas lágrimas para eu não partir.
Mas eu queria partir, para lhes trazer o pão que imploravam no escuro... E tudo partiu na estúpida explosão de cólera, de cinzas e fantasmas de outros.
Todos os cantos do mundo se inclinaram para os receber no momento em que o fim estava iminente, mas ninguém mais se lembrou do sol do antes...